Diversão
Educação,
diversão e preconceito. Para discutir estes três temas essenciais na
vida de qualquer um, foram convidados quatro jovens negros residentes em
cidades distintas: Jaciara dos Santos é natural de Recife, Adriana
Nascimento, de Diadema, Marcelo Lopes, mais conhecido como MC Tam, do
Rio de Janeiro e Marcelo Cruz, vive em Florianópolis. Além de serem
negros, eles têm em comum o fato de realizar trabalhos sociais nas
comunidades onde moram.
Belém
é o ponto de partida desta reportagem. A equipe de filmagens registrou o
que a juventude negra, que vive na periferia da capital, inventa para
se divertir. “Vamos começar pelo break que movimenta o centro da cidade,
em frente ao mercado de São Brás”, localiza o agente de saúde Marcos
Souza. O primeiro a dar entrevista é o rapaz Ismael Rodrigues, que
atende pelo apelido de B. Boy Will. Para ele “o break serve para unir o
preto ao branco. Quando um B. Boy branco vem aqui treinar com a gente é
como se ele estivesse pedindo perdão pelo que os ancestrais deles
fizeram com os nossos no passado”, filosofa.
Entre
escovas e tranças caprichadas, a pesquisadora Leda Souza confessa:
“Quando a gente vai num salão de beleza comum, a primeira coisa que o
profissional fala quando olha nosso cabelo é ‘ah, vamos alisar!’. Aqui
não. Você chega e eles valorizam a sua identidade negra”. Há outras
maneiras de enaltecer a cultura negra, como, por exemplo, através da
black music. As carrapetas do DJ Morcegão, pseudônimo de Gilmar Cardoso,
não nos deixa mentir. “Tocamos do rap ao reggae, da black music ao
funk, tá ligado? E toda essa mistura de black contagia muito a
rapaziada”.
Nilma
Bentes, do Centro de Defesa do Negro, explica que é “em torno da
cultura, ou seja, do hip hop, do pagode, da capoeira que a juventude
negra tem se organizado para aumentar a auto-estima e as possibilidades
de ingresso no mercado de trabalho”. Marcelo Cruz reforça o coro: “Tem
que ter apoio familiar para a pessoa querer fazer algo, como um esporte,
e não ficar acomodado em casa à toa. Todos sem estímulo que conheço
hoje estão no mundo do crime”.
No
estúdio do programa, MC Tam compara as opções de lazer de Belém com a
programação do Rio de Janeiro. “Lá onde eu moro é a mesma coisa. Para se
divertir a gente tem que criar. Lá não tem computador nem vídeo game.
Muitas crianças não têm bicicleta, muitas pessoas não tem nem onde morar
direito”. As professoras de dança Jaciara dos Santos e Adriana
Nascimento traçam um paralelo com os ambientes que lhes são familiares.
“Em
Recife também não é diferente. Nós, os negros, temos procurado muito
esse resgate das nossas raízes”, diz Jaciara. “Em Diadema, acontece uma
festa de hip hop uma vez por mês. Assim, esses adolescentes ganham um
lugar para mostrar o que eles treinaram. Antes, o hip hop ficava
restrito às ruas. Agora foi valorizado e já chegou nos centros
culturais”, comemora Adriana.
Estar
associado à cultura afro é sinal de modernidade. “Hoje em dia os jovens
freqüentam os lugares negros. Não tem mais aquela vergonha de estar
onde o hip hop, o afoxé, a capoeira acontecem”, avalia Jaciara. Tem uma
coisa que incomoda muito o estudante Marcelo Cruz. Ele reclama que, nas
aulas de História, só estuda sobre Roma e outros países europeus. Da
África, só Zumbi e escravidão. A um passo de ingressar na faculdade
admite que “nunca ouvi falar sobre cotas de negros na sala de aula e na
TV vejo pouco”.
Música como profissão
Enquanto
isso, no Maranhão e no Espírito Santo, há jovens decididos a abraçar a
música como profissão. Daniel, por exemplo, deixou o interior do
Espírito Santo em busca de um sonho na metrópole. “Sempre quis fazer
faculdade de música, mas eu não sabia como. Meu pai é semi-analfabeto e
minha mãe acabou de fazer o segundo grau agora, num supletivo. Eu tenho
que vencer”. Ele mora sozinho num pequeno quarto no centro de Vitória e
conseguiu uma vaga na faculdade de música do Espírito Santo.
Daniel
faz parte do coral afro no Museu do Negro, referência para a garotada
da cidade. Já Mayara, também integrante do grupo, carrega uma história
diferente. “Na verdade, eu tive muitas oportunidades, meu pai sempre
lutou muito para dar o melhor para minha família”, ressalta a moça. Como
estudante de administração, Mayara conseguiu estágio numa grande
empresa da cidade. Por enquanto está ótimo assim, mas ela revelou que
cursará em breve uma faculdade de canto lírico.
Em
São Luiz do Maranhão, os alunos fabricam instrumentos e testam planos
para o futuro. Cerca de 90 jovens participam do projeto ‘Sonho dos
Erês’, oferecido pelo Centro de Cultura Negra do Maranhão, em parceria
com a iniciativa privada. “A idéia é que todo produto comercializado
seja revertido em renda para os alunos e para a compra de matéria-prima
do projeto. Eles ouvem reclamações diárias dos pais porque já
completaram dezoito anos e ainda não ganham o suficiente para o seu
sustento”, explica a coordenadora Carmen Lúcia.
De
acordo com o instrutor de grafite Emerson Melo, “essa perspectiva de
trabalho a gente dá através de fachadas de lojas, decoração de festas e
painéis para shows”. A diretor do Centro de Cultura Negra resume
“Trabalhamos com o fortalecimento da auto-estima de crianças e
adolescentes negros, a fim de construir uma outra realidade social para
essas pessoas”. O próprio MC Tam serve de exemplo do que a música pode
fazer com uma vida. “Graças ao funk eu conquistei tudo que quis. Eu, que
moro numa comunidade, tô viajando para um montão de lugar. Graças ao
funk não passo mais necessidade”.
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Relogio: Vocês e o Tempo
quinta-feira, 11 de julho de 2013
CONTEÚDO A COR DA CULTURA
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