Relogio: Vocês e o Tempo

quinta-feira, 11 de julho de 2013

CONTEÚDO A COR DA CULTURA

A TELEVISÃO NA ESCOLA: A VEZ DA NEGRITUDE
 

Sátira Machadoi
Na década de 50, a chegada da televisão instituiu uma nova maneira das
crianças interagirem com o mundo e, desde então, muitas produções culturais
audiovisuais foram oferecidas aos telespectadores mirins. Com a globalização, o
olhar sobre a diversidade dos vários povos do mundo ganhou notoriedade no
encontro das diferenças e ao (re)conhecimento das múltiplas faces da criança
brasileira e da diversidade cultural do país.
Em 1952, a telinha torna-se popular entre meninos e meninas com as
transmissões do programa Teatro Escola de São Paulo, pela TV Tupi. No programa,
Júlio Gouveia e Tatiana Belinky reinventam as histórias da obra de Monteiro Lobado.
Em 1920, Lobato lançou A menina do narizinho arrebitado. Em 1921, o autor
reeditada a obra com o novo título Narizinho arrebitado, acrescida de uma segunda
parte conhecida como “O Sítio do pica-pau amarelo”. Abordando questões sociais,
políticas, econômicas e culturais nas ações vividas pelas personagens em uma
fazenda, Lobato inclui várias outras histórias à obra, até 1944, em livros como
“Reinações de Narizinho” e “Novas reinações de Narizinho”.
Na tevê, o programa “O Sítio do pica-pau amarelo” foi exibido por uma década
ao vivo, a partir de adaptações teatrais da obra dramatizada nos estúdios da TV
Tupi. Em 1964, a TV Cutlura de São Paulo mostra sua versão do Sítio. De 1967 a
1969, o programa é recriado por roteiristas, produtores e editores a partir da
tecnologia do videoteipe (gravado), na TV Bandeirantes. De 1977 a 1986, a nova
versão da TV Globo foi exportada para vários países e censurada em Angola, pela
representação estereotipada da Tia Nastácia que lhes parecia uma escrava.
Maria Cristina Soares de Gouvêa (2005) destaca que, ante a reação das
crianças de Lobato aos seus contos, Tia Nastácia perdeu o posto de contadora de
histórias reassumindo seu lugar de cozinheira, sendo substituída por Dona Benta
que, com auxílio dos livros, ‘sabe contar histórias de verdade’. Marisa Lajolo, em seu
trabalho “A figura do negro em Monteiro Lobato” comenta que ao longo da obra
infantil lobatiana Tia Nastácia é constrangida pelos insultos da personagem Emília,
que em momentos de discussão e desentendimento desrespeita a velha cozinheira,
como sucede em algumas passagens de ‘Histórias de Tia Nastácia’:
‘Pois cá comigo - disse Emília - só aturo estas histórias como estudos da
ignorância e burrice do povo. Prazer não sinto nenhum. Não são
engraçadas, não têm humorismo. Parecem-me muito grosseiras e até
bárbaras - coisa mesmo de negra beiçuda, como Tia Nastácia. Não gosto,
não gosto, e não gosto! (...) - Bem se vê que é preta e beiçuda ! Não tem a
menor filosofia, esta diaba. Sina é o seu nariz, sabe ?’ (LOBATO, 1937)
Similares má-criações têm servido de munição para leituras que tomam o
xingamento como manifestação explícita do racismo de Lobato, questão incômoda,
de que os estudiosos do escritor têm de dar conta. Na obra, Lobato subscreve
preconceitos etnocêntricos e mesmo racistas. (LAJOLO, 1988). Muitas gerações de
brasileiros assistiram a representação da cultura afro-brasileira na mídia através da
negra Tia Nastácia e suas lendas, protagonizada por várias atrizes. Em 2001, a
Globo reeditou o programa com novos argumentos e, em 2005, a lançou como
novela infantil ainda no ar (www.sitio.globo.com), mantendo a personagem Tia
Nastácia.
Já a apresentadora Xuxa é tida como modelo de beleza: magra de cabelos
lisos e louros. Maria das Graças Meneghel passou a encantar os baixinhos a partir
da década de 80. Em 1983, a Xuxa apresentou o programa “Clube da Criança” na TV
Manchete. Na TV Globo, a apresentadora infantil teve os programas “Xou da Xuxa”
(1986 a 1992), “Programa da Xuxa” (1993), “Xuxa Park” (1994), “Planeta Xuxa”
(1997), “Xuxa no Mundo da Imaginação” (2003) e mantém o “TV Xuxa”, que estreou
em 2005 (www.tvxuxa.globo.com). Desde sua primeira aparição, a apresentadora
infantil mais popular do Brasil foi criticada por erotizar ou incentivar às crianças ao
consumismo. Flavia Barreto e Mônica Silvestri, na pesquisa “Relações dialógicas
interculturais: brinquedos e gênero”, ressaltam:
“Ter cabelos louros, lisos e compridos expressa a imaginação coletiva
sobre o feminino, tomando como modelo uma estética dominante,
etnocêntrica e ideológica, cuja imagem da mulher europeizada, ou
americanizada é enaltecida.” (BARRETO, 2007)
Para as autoras, a distância entre esta aparência e a realidade social
miscigenada e tropical contribui para que a imagem, da própria criança, seja
desvalorizada, podendo reduzir-lhe a auto-estima, colocando-a em um lugar
inferiorizado.
No ar desde 1994, representando a brasilidade e sem inserções estrangeiras,
o programa “Castelo Rá-Tim-Bum” da TV Cultura/SP (www.tvcultura.com.br) é uma
produção infantil com qualidades técnica (imagem, som, edição e ritmo) e de
conteúdo (padrões sociais, econômicos, políticos e culturais) reconhecidas pelos
vários prêmios que recebeu. Na pesquisa “Programas educativos de televisão para
as crianças brasileiras: critérios de planejamentos propostos a partir das análises de
Vila Sésamo e Rá Tim Bum”, Adriana Maricato de Souza, faz a ressalva:
“O episódio ‘Zula, a menina Azul”, do Castelo, é exemplar no trato do
conflito – ou sua distorção/mascaramento pelos programas brasileiros.
Nele é desenvolvido o tema ‘discriminação’, cuja metáfora é o azul
(referência ao racismo com possibilidades mais amplas de interpretação).
Os personagens infantis são extremamente cruéis com a menina
diferente, a rejeitam, a isolam. No decorrer da trama, e a partir da
energética interferência de um adulto (Penélope, a jornalista), aprendem
que foram preconceituosos e passam a respeitar e a apreciar a diferença
cultural. (SOUZA, 2000)
Souza denuncia que o episódio procura reforçar a idéia de democracia racial,
quando o preconceito racial não é tratado com especificidade e a vítima do
preconceito é uma personagem de fora da trama. Respeitar a diferença cultural sem
contextualização da cultura afro-brasileira é uma atitude pouco provável. A redução
da problemática do racismo fica evidente, uma vez que o programa tem em seu
núcleo central uma atriz negra. Mesmo assim, nada na personagem Biba (Cintya
Raquel) a caracteriza como uma criança não-branca e em nenhum dos 90 episódios
da série, a menina negra é constrangida por ser diferente, algo irreal na sociedade
brasileira e nas escolas do país. Em entrevista à Multirio, o cineastra Joel Zito inclui a
infância nessa discussão, salientando:
“A TV brasileira praticamente não oferece a possibilidade de nossa criança
afro-descendente ter modelos que promovam a sua auto-estima, enquanto
que as crianças brancas, especialmente as de padrão ariano, louras dos
olhos claros, são hiper-representadas nos comerciais, nas telenovelas e
nos filmes.” (ARAÚJO, 2007)
Araújo sentencia uma conseqüência óbvia: enquanto a criança negra tem
vergonha de sua negritude, de sua origem racial, porque cresce em um ambiente
social e educacional de recusas que promovem uma auto-estima negativa, a criança
branca cresce superpaparicada e com uma impressão de que é superior a todas as
outras, provocando distorções tanto nas crianças negras quanto nas crianças
brancas.
Em 20 de dezembro de 1996, a pluralidade cultural foi incluída nos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) da Lei Federal 9.394 - Lei de Diretrizes e
Bases de Educação Nacional (LDB/1996) pelo gaúcho Paulo Renato Souza
enquanto ministro da Educação, no governo do presidente Fernando Henrique
Cardoso. Os parâmetros sugerem que os currículos escolares sejam mais
comprometidos com pluralidade e a cidadania dos brasileiros. Em 2000, o censo
realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e de Estatística (IBGE) revelou que
quase 50% da população brasileira se autodeclara negraii.
Assim, em 9 de janeiro de 2003, o ministro da educação Cristovam Buarque e
o presidente Luiz Inácio Lula da Silva alteraram a LDB/1996 e aprovaram a Lei
Federal 10.639, de autoria da deputada gaúcha Esther Grossi e do deputado mineiro
Bem Hur Ferreira, atendendo as reivindicações do movimento social negro brasileiro.
A lei determina que o Dia Nacional da Consciência Negra faça parte do calendário
escolar e a inclusão do ensino sobre a "História e a Cultura Afro-Brasileira" nos
currículos das escolas públicas e particulares do país.
No contexto brasileiro, a televisão ganha um espaço privilegiado nos lares e
nas atividades pedagógicas dos professores. No contexto escolar, as relações
humanas são determinantes na construção das identidades das crianças, de
diversas culturas. As pesquisas da educadora Eliane Cavalleiro apontam para a
reflexão sobre a questão das relações étnico-raciais e de educação.
Cavalleiro acredita que toda a escola deve estar envolvida na construção
positiva das identidades de seus alunos, ressaltando que o currículo escolar, o
material didático, a formação docente, o enfrentamento das situações de
discriminação, a abolição do uso de termos pejorativos, a distribuição igual de
estímulos e a valorização da diversidade escolar devem permear as relações
interpessoais tanto na sociedade brasileira como no sistema de ensino, sob pena de
se criar um conhecimento estereotipado e preconceituoso do diferente.
(CAVALLEIRO, 2003)
Baseados na Lei, ativistas e pesquisadores de várias áreas e gerações,
empenhados em melhor abordar a diversidade cultural que caracteriza a sociedade
brasileira, uniram-se para traduzir esse interesse em programas de televisão com
caráter informativo e educativo, dando visibilidade a negritude na mídia. Em 2003,
essa idéia foi apresentada para a TV Globo que a encaminhou para a Fundação
Roberto Marinho, através do CANAL FUTURA.
Em 2004, a TV FUTURA passou a desenvolver o projeto A COR DA CULTURA em
parceria com o Centro de Informação e Documentação do Artista Negro (Cidan/RJ),
a Secretaria Especial de Políticas de Promoção de Igualdade Racial da Presidência
da República (Seppir), o Ministério da Educação (MEC), a Petrobras e entidades
regionais do movimento negro dos estados do RJ, SP, RS, MS, BA, MA e PA. Para
incluir a representação da cultura negra do Rio Grande do Sul no projeto, foram
realizadas parcerias com ONGs, Universidades e municípios como: Porto Alegre,
Caxias do Sul, Gravataí, São Jerônimo, Dois Irmãos, Ivoti, Novo Hamburgo,
Riozinho, Rolante, São Leopoldo, Parobé, Taquara, Campo Bom, Lindolfo Collor e
Igrejinha.
Em 2005, após a exibição dos programas de televisão do projeto no CANAL
FUTURA, o MEC passou a distribuir o Kit Educacional que contém: Cadernos de
Textos “Saberes e Fazeres” em três volumes intitulados Modos de Ver, Modos de
Sentir e Modos de Interagir; o livro “Memória das Palavras”, glossário com 206
palavras de origem africana; CD “Gonguê: a herança africana que construiu a música
brasileira”, com 16 músicas/sons; o jogo de tabuleiro “Heróis de todo o mundo”,
sobre curiosidades de personalidades que representam a cultura afro-brasileira; e as
cinco séries produzidas para a tevê.
Os programas de televisão produzidos foram: a série LIVROS ANIMADOS, que
traz adaptações de livros de literatura infantil com a temática afro-brasileira (10
episódios, em 3 DVDs); os mini-documentários HERÓIS DE TODO O MUNDO, que conta a
história de algumas personalidades negras brasileiras (30 episódios, em 1 DVD); a
série MOJUBÁ, documentários sobre a religiosidade de matriz africana (07 episódios,
em 3 DVDs); o NOTA 10, que mostra reflexões sobre a temática das relações étnicoraciais
(05 episódios, em 2 DVDs); e o programa AÇÃO, que divulga projetos sociais
promovidos pela negritude nos vários estados do Brasil (04 episódios, em 1 DVD).
A série Livros Animados, destinada as crianças de 5 a 10 anos, tem um
propósito educacional e discute temas como multiculturalismo, identidade, memória e
etnia. Desde essas temáticas a série focaliza a cultura negra como formadora da
sociedade brasileira visando a instaurar o debate em torno da identidade étnica, mais
especificamente a identidade dos afro-brasileiros. A produção do programa adapta
histórias da literatura infantil brasileira, que tragam a negritude em sua essência,
para a linguagem audiovisual da tevê. A historiadora Lúcia Silva, a especialista em
livros infantis que tratam da temática afro-brasileira, Andréia Lisboa (militante do
movimento negro) e a Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ)
prestaram consultoria para a produção do programa. Na série, a apresentadora do
programa infantil, mulher negra, interage com crianças de várias idades e etnias que
participam dos episódios.
Vanessa Pascale é a primeira mulher negra a protagonizar a apresentação de
um programa infantil de televisão no Brasil. Em entrevista, a coordenadora de
mobilização comunitária do CANAL FUTURA da Fundação Roberto Marinho, Ana Paula
Brandão declara: “A Vanessa foi escolhida após um teste de elenco. Queríamos uma
mulher negra, que ficaria responsável por brincar, conversar com as crianças,
conduzir e ler as histórias dos livros no programa.” Vanessa Melani Pascale
Ekpenyong é filha de um nigeriano e de uma brasileira. Foi criada pela avó materna e
é modelo desde os 13 anos. É formada em interpretação, pela Escola Cal -
Laranjeiras/RJ. Participou de vídeoclipes do Shank, Dudu Nobre, Wilson Simoninha e
Elvis Crespo e fez comerciais para o Bradesco, a Baccardi, a Sadia, entre outros.
Ficou nacionalmente conhecida ao participar do reality show Big Brother Brasil I, na
TV Globo.
A história “O Menino Nito” é a primeira obra literária a ser adaptada para a
tevê. Fala sobre um menino que chorava muito e supera dificuldades, é de autoria de
Sônia Rosa e tem ilustrações de Victor Tavares. A segunda história é “A Menina
Bonita do Laço de Fita” de Ana Maria Machado, com ilustrações de Claudius, que
traz a história de um coelho bem branquinho que faz de tudo para ficar pretinho
como a menina negra que ele acha linda. Essas são apresentadas no primeiro
episódio da série.
No episódio 2, são apresentadas as fábulas “A Mosca Trapalhona”, “Tartaruga
e o Leopardo”, “A Moça e a Serpente” e “O Cassolo e as Abelhas”, dos livros
“Bichos da África 1 e 2” de Rogério Andrade Barbosa e ilustrações de Ciça
Fittipaldi. Lembranças da África é o tema do episódio 3. Nele os livros “Capoeira”,
“Maracatu” e “Jongo”, de Sônia Rosa e ilustrações de Rosinha Campos, mostram
heranças do continente africano recriadas no Brasil. Também nesse episódio, a obra
“Reizinhos do Congo”, de Edmilson de Almeida e ilustrações de Graça Lima,
mostra festas de coroamento de reis africanos. No episódio 4, a apresentadora e as
crianças mostram os “Contos Africanos”, com ilustrações de Maurício Veneza, e a
obra “Como as Histórias se Espalham pelo Mundo” que traz um ratinho
conhecedor da variedade das culturas africanas, ilustrado por Graça Lima, ambos de
autoria de Rogério Andrade Barbosa.
A religiosidade de matriz negro-africana está presente no episódio 5, com a
história “Ifá, O Advinho”, de Reginaldo Prandi e ilustrações de Pedro Rafael. E no
episódio 6, nas obras “A Botija de Ouro”, com ilustrações de Zé Flávio, e “O
Presente de Ossanha”, com ilustrações de Maurício Veneza, ambos de autoria de
Joel Rufino. No episódio 7, os telespectadores conhecem as gêmeas “Ana e Ana”.
Essas personagens de Célia Godoy mostram duas meninas parecidas fisicamente,
mas com comportamentos diferentes. As ilustrações são de Fê. O episódio traz ainda
a história “A Pirilampéia e os dois meninos de Tatipurum” de garotos que moram
em extremos da Terra. A autoria é de Joel Rufino e as ilustrações de Walter Ono.
No oitavo episódio, a série apresenta “Bruna e a Galinha d`Angola”, de
Gercilga de Almeida e ilustrações de Valéria Saraiva. Também faz parte do episódio
a história “Berimbau”, de Raquel Coelho. No episódio 9, a história fala de navios
que usam a força do vento na obra “O Filho do Vento”, de Rogério Andrade Barbosa
e ilustrações de Graça Lima. No último episódio, o décimo, as adaptações são “O
Menino Inesperado” e “Lili – a Rainha das Escolhas”, de Elisa Lucinda, com
ilustrações de Graça Lima. (BRANDÃO, 2006)
Os cinco programas (56 episódios) fazem parte da grade do CANAL FUTURA,
veiculados também pela TV Unisinos de São Leopoldo/RS. O programa AÇÃO faz
parte, também, da grade de programação da TV Globo, aos sábados. E grande parte
dos conteúdos estão disponíveis no site do projeto (www.acordacultura.org.br). Os
programas ainda estão no ar. O MOJUBÁ também foi exibido na TVE/RJ, TV Bahia e
no Canal Brasil. HERÓIS DE TODO O MUNDO foi exibido pela TVE/RJ e TV Bahia. Todos
os programas fazem parte do kit do TV Escola. A Secretaria Municipal de Educação
de SP pediu autorização para reproduzir todos os cadernos do Kit. A Rede Globo
distribuiu 2 mil kits para sua rede do “Amigos da Escola”. As secretarias municipais
de Porto Alegre, Santo André e São Luís ampliaram a capacitação e estenderam
para toda a sua rede de escolas. E não param de chegar pedidos de Kit no CANAL
FUTURA e nos parceiros.
Eliane Cavalleiro, enquanto titular da Coordenação de Diversidade e Inclusão
Educacional, do Departamento de Educação para a Diversidade e Cidadania, da
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e Diversidade (Secad), do
Ministério da Educação (MEC), foi peça chave na construção do Kit Educativo do
projeto A COR DA CULTURA. Em maio de 2006, numa primeira etapa, o MEC e o
CANAL FUTURA distribuíram o Kit para mais de duas mil escolas de vários estados e
capacitou mais 4 mil professores e agentes multiplicadores para a utilização dos
programas em suas atividades, como forma de política de ação afirmativa baseada
na Lei 10.639/03. Uma segunda etapa de distribuição está prevista para os próximos
anos.
Em 2006, a Secretaria Municipal de Educação de Porto Alegre (Smed/POA),
através da Assessoria Pedagógica para as Relações Étnico-Raciais, implantou o
projeto em suas escolas municipais de ensino fundamental e médio, da capital.
Heloísa Rodrigues de Souza, da Escola Municipal de Ensino Fundamental Carlos
Pessoa de Brum compartilha sua experiência:
“A grande dificuldade dos professores em trabalhar com as relações
raciais com crianças pequenas foi uma das motivações do projeto (A Cor
da Cultura na Escola). A baixa auto-estima das crianças negras, que
negam sua origem e identidade, são evidenciadas cotidianamente. A
violência verbal que gera, muitas vezes, a violência física impeliu os
professores a buscar em sala de aula, de forma lúdica e linguagem
adequada, abordar o direito à diferença, a valorização da raça negra, da
cor, da textura do cabelo, e discutir as relações raciais.” (SANTOS, 2007)
A escola de Heloísa fica localizada na Restinga Velha, em Porto Alegre/RS,
bairro criado pela Lei Municipal 6571 de 8 de janeiro de 1990, que denomina de
Bairro Restinga as Vila Pitinga, Vila Restinga Nova, Vila Restinga Velha, Vila
Mariana, Barro Vermelho, Chácara do Banco, Vila Flor da Restinga, Vila Monte
Castelo e Vila Santa Rita, quando o Departamento Municipal de Habitação
(DEMHAB) transferiu os habitantes da região central para um local 22 km afastado
do centro da capital. É um dos bairros mais populosos da cidade, com maioria de
habitantes afro-brasileiros.
No mesmo ano, as Secretarias Municipais de Educação de São Leopoldo,
Caxias do Sul, Gravataí, Santa Maria, Porto Alegre, entre outras cidades gaúchas
que mantêm uma assessoria pedagógica para as relações étnico-raciais ou órgão
similar, implantaram o projeto nas escolas da rede. Naquele ano, a Secretaria
Estadual de Educação do RS (Seduc) não implantou o projeto A COR DA CULTURA nas
escolas estaduais do Rio Grande do Sul. Mesmo assim, há muitos registros de
professores estaduais, predominantemente afro-brasileiros, que utilizam os materiais
do projeto em sala de aula.
A pesquisa PRODUÇÃO AFRO-CULTURAL PARA A CRIANÇA, orientada pela Profa.
Dra. Leunice Martins de Oliveira da PUCRS, aponta que, a partir da implementação
da Lei 10.639/03 novas produções culturais brasileiras buscam contemplar a cultura
negra (www.pucrs.br/faced/educomafro). Hoje, a televisão brasileira está buscando
formas de respeitar a inteligência da criança, que é criativa, interativa e ávida em
conhecer o universo que a cerca; de contemplar a diversidade cognitiva, psíquica e
social das crianças; de contextualizar e integrar os conteúdos, como forma de
veiculação de temas mais comprometidos com a pluralidade; de ampliar os
conteúdos escolares, abordando questões sociais, econômicas e culturais,
procurando transmitir valores cidadãos aos telespectadores mirins.
REFERÊNCIAS
ARAÚJO, Joel Zito. A criança negra na televisão brasileira. Rio de Janeiro: RIO
MÍDIA, 2007 (www.multirio.rj.gov.br)
ARAÚJO, Joel Zito. A negação do Brasil: o negro na telenovela brasileira. São
Paulo: Senac, 2000.
BRANDÃO, Ana Paula. Saberes e Fazeres: modos de ver. Rio de Janeiro:
Fundação Roberto Marinho, 2006. (A Cor da Cultura)
BRANDÃO, Ana Paula. A Cor da Cultura: rompendo o silêncio. Intercom –
Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação - XXIX
Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – UnB – 6 a 9 de setembro de
2006.
CAVALLEIRO, Eliane. Do silêncio do lar ao fracasso escolar: racismo,
preconceito e discriminação na educação infantil. São Paulo: Contexto, 2003.
GOUVEA, Maria Cristina Soares de. Imagens do negro na literatura infantil
brasileira: análise historiográfica. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 1, ,
p. 79-91, jan./abr. 2005.
LAJOLO, Marisa. A figura do negro em Monteiro Lobato. Congresso 100 Anos de
Abolição, Universidade de São Paulo, 1988.
LOBATO, Monteiro. Histórias de Tia Nastácia. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1937.
SANT’ANNA, Wânia. Marco conceitual do projeto A Cor da Cultura. Brasília:
Seppir, 2005.
SANTOS, Adriana Conceição Santos dos (Org.) Diversidade Étnica: dialogando
com a história e a cultura negra. Porto Alegre: Prefeitura Municipal de Porto
Alegre/Secretaria Municipal de Educação, 2007.
SILVEIRA, Oliveira. Vinte de Novembro: história e produção do conhecimento. In.
SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves e SILVÉRIO, Valter Roberto. (org). Educação e
Ações Afirmativas: entre a injustiça simbólica e a injustiça econômica. Brasília:
INEP, 2003.
NOTAS
i Professora habilitada pelo Instituto de Educação General Flores da Cunha (1988). Jornalista
formada pela Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul (1995). Aperfeiçoamento (1998) e Mestrado (2000) realizados na Faculdade de Letras da PUCRS.
Autora do livro “Poesia Infantil na TV: a experiência do Castelo Rá-Tim-Bum” da Coleção
Comunicação da Famecos, da EDIPUCRS (2002). Professora parceira e pesquisadora do Grupo de
Pesquisa Educomunicação e Produção Cultural Afro-Brasileira (EDUCOM AFRO –
www.pucrs.br/viamao/educomafro) da Faculdade de Educação do Campus Viamão da PUCRS.
Professora participante do Grupo de Pesquisa Mídia e Multiculturalismo da Unisinos/RS. Autora do
capítulo “Mulher Afro-Gaúcha: negritude à flor da pele”, do livro Mulheres do Rio Grande do Sul:
diversidade, do Museu Antropológico do RS, SFERASRP (2006). Formação como conselheira em
direitos humanos, ênfase em igualdade racial, pela Secretaria Especial de Direitos Humanos do
Governo Federal. Estuda a mídia, a criança, a educomunicação, com ênfase nos estudos de
cidadania e das identidades afro-brasileiras. É jornalista editora do Portal da Negritude Gaúcha
(www.ccnrs.com.br).
ii O IBGE realiza censos nos quais os brasileiros podem declarar sua “cor” ou “raça” como branca,
preta, amarela, parda, indígena ou sem declaração. O percentual de “negros” no Brasil é a soma entre
os pretos e os pardos, declarados no censo do IBGE.

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